Enquanto eu acreditar no que escrevo ficará tudo bem. Enquanto eu escrever que estou feliz não precisarei mentir e nem minimizar a dor de estar completa, sem esperar nada e ninguém. Há dor na felicidade: a dor de saber-se única no universo, a dor de ser inteira em si e dividir espaço com tantas outras pessoas inteiras que não precisam de um pedaço meu para se manterem em pé, que não precisam da minha alma para sustentar a delas. É por merecimento que as pessoas felizes se encontram e é mantendo-se inteiras que se encaixam e se multiplicam. Por muito tempo convivi com o lado cruel da dor. Acostumada, choro assistindo filmes, ouvindo música, observando as vidas que começam e que estão perto do fim, as gentilezas que ainda existem espalhadas pelos cantos do mundo. É sobre isso que quero falar, sobre um dia, mais ou menos isso, mais ou menos assim, que não era uma vez, mas era um outro dia. Uma quinta-feira. Chorei ao ver pai e filho soltarem pipa em uma praça rodeada de carros congestionados transportando homens engravatados e mulheres de meia-calça. Do outro lado da rua, depois da praça e dos carros, me comovi em espasmos de alegria enquanto os grãos de areia caíam na ampulheta. Eu sem me importar. Eu completa de cabeça, alma e coração. Eu me sabendo atrasada para um compromisso da vida de cá e me sabendo pontual no compromisso da vida de lá. Eu sentindo a cena fazer o meu coração diminuir e dilatar. Eu arrepiada nos pelos dos braços e na espinha. Eu com olhos de mar. Eu com passos lentos até o terminal da rodoviária. Eu tirando os óculos escuros para sentir a alegria rolar no rosto até despencar do queixo. Eu inteira. E só eu parada, enquanto as outras vidas corriam apressadas para muito longe de si e muito longe de qualquer lugar. Eu encontrada, chorando de soluçar conservando os lábios em meio-sorriso. Eu ajoelhada na passarela, sustentando o rosto com as duas mãos para ele não desabar, chorando a dor da alegria de estar viva e inteira no momento presente e não saber o que fazer com o peso da memória. Eu, patética estranha que acordou e se reconheceu no espelho. Eles, todos, passando e me olhando de cima e me deixando moedas no chão. Eu, com olhos arregalados entre os dedos da mão, com medo de perder a imagem do espelho. Eles, todos, me olhando como se contemplassem uma cena de teatro de rua. Eu, como se fizesse parte do cinema mudo em preto e branco de Chaplin. Eu, metade chorando e metade sorrindo, afastando as mãos do rosto, erguendo a cabeça e fitando o inexistente, desdobrando os joelhos, catando as moedas, segura dos meus atos. Eu, em pé, procurando equilíbrio nas pernas de pau. Moedas no bolso, óculos escuros. Faço sinal para o ônibus parar.
É por você. É tudo por você. As samambaias são por você. O meu sono, meu sonho, meus dias: você! Acordar, despertar, respirar; tudo você. Você! Você que me faz feliz, você que me aninhou, você que pôs a cabeça em meu ombro enquanto riamos e chorávamos durante um filme onde nos encontramos. Você que me levou pra ver o mundo de cima de uma ponte. Tudo era artificial, menos nós.
ResponderExcluirEu te amo, Lilica!
eu nem ia comentar pq só me repito aqui. mas comento pq vc sabe q meus comentários repetitivos guardam td uma impressão de novidade por trás... se nao sabe, fica sabendo agora; hehehe =]~
ResponderExcluiresse texto ta lindo dmais, pipoca! vou ser egoísta e dizer q ele parece ter sido escrito pra mim. ok? ok.
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