Lembrou de coisas que aprendera, como "que seja doce". Sempre quis que tudo fosse doce, até que a doçura aconteceu, como o cotidiano das coisas acontecem. Sem que pudesse conter, evitar, parar. Aconteceu como acontece o dia, que vem todos os dias sem licença, penetrando as frestas da cortina, cravando o seu lugar na noite, preenchendo todos os espaços.
Pôde viver a doçura integralmente até a chegada do diabetes.
Chegou inesperado, como uma notícia de morte dada no dia do aniversário. Sentiu-se criança fácil: doce roubado de entre os dentes, desabraçado dos lábios. Atônita, olhos secos e arregalados, uma corrente de ar frio percorria o corpo de 30. Trinta: repetiam as vozes de dentro da cabeça. Trinta. E por isso o choro secava preso por baixo da pele. O sofrimento não vale à pena, não vale o peso, não vale a dor. O sofrimento não vale, porque nada condiz ao seu real valor. As preciosidades não são exibidas em vitrines. São tesouros escondidos sem mapa da mina. Ainda as vozes.
Interpeladas pela voz empostada da consciência. Eu não pago o sofrimento à vista, não pago à prestação. Eu o acolho de graça, solícita: o conforto entre as mãos em concha e o levo delicado até o peito. E lá ele se acomoda, sem pretensão. Apenas deita para descansar, para se confortar das incontáveis vezes que fora evitado, que fora excluído, discriminado. Ele vem úmido, manso, franzino. Mas logo incha de mágoa, como esponja na água. Incha até transbordar. No de dentro da pele, perto dos músculos, dos ossos, dos órgãos: inunda tudo. Contrasta com o inverno seco.
Uma mulher de trinta, doce roubado da boca, olhos de vidro brilhando no sol. Diabetes. Procura curar solidão com insulina e adoçar a vida com aspartame. Lembra-se da doçura natural da cana de açúcar. Adulta, apenas suporta artificialidades.
Leu no seu caderno adolescente:
"Então, que seja doce. Repito todas as manhãs, ao abrir as janelas para deixar entrar o sol ou o cinza dos dias, bem assim, que seja doce. Quando há sol, e esse sol bate na minha cara amassada do sono ou da insônia, contemplando as partículas de poeira soltas no ar, feito um pequeno universo; repito sete vezes para dar sorte: que seja doce que seja doce que seja doce e assim por diante. Mas, se alguém me perguntasse o que deverá ser doce, talvez não saiba responder. Tudo é tão vago como se fosse nada."
Fechou os olhos do corpo. Abriu os olhos da alma. Dormiu de conchinha com o sonho.
Pôde viver a doçura integralmente até a chegada do diabetes.
Chegou inesperado, como uma notícia de morte dada no dia do aniversário. Sentiu-se criança fácil: doce roubado de entre os dentes, desabraçado dos lábios. Atônita, olhos secos e arregalados, uma corrente de ar frio percorria o corpo de 30. Trinta: repetiam as vozes de dentro da cabeça. Trinta. E por isso o choro secava preso por baixo da pele. O sofrimento não vale à pena, não vale o peso, não vale a dor. O sofrimento não vale, porque nada condiz ao seu real valor. As preciosidades não são exibidas em vitrines. São tesouros escondidos sem mapa da mina. Ainda as vozes.
Interpeladas pela voz empostada da consciência. Eu não pago o sofrimento à vista, não pago à prestação. Eu o acolho de graça, solícita: o conforto entre as mãos em concha e o levo delicado até o peito. E lá ele se acomoda, sem pretensão. Apenas deita para descansar, para se confortar das incontáveis vezes que fora evitado, que fora excluído, discriminado. Ele vem úmido, manso, franzino. Mas logo incha de mágoa, como esponja na água. Incha até transbordar. No de dentro da pele, perto dos músculos, dos ossos, dos órgãos: inunda tudo. Contrasta com o inverno seco.
Uma mulher de trinta, doce roubado da boca, olhos de vidro brilhando no sol. Diabetes. Procura curar solidão com insulina e adoçar a vida com aspartame. Lembra-se da doçura natural da cana de açúcar. Adulta, apenas suporta artificialidades.
Leu no seu caderno adolescente:
"Então, que seja doce. Repito todas as manhãs, ao abrir as janelas para deixar entrar o sol ou o cinza dos dias, bem assim, que seja doce. Quando há sol, e esse sol bate na minha cara amassada do sono ou da insônia, contemplando as partículas de poeira soltas no ar, feito um pequeno universo; repito sete vezes para dar sorte: que seja doce que seja doce que seja doce e assim por diante. Mas, se alguém me perguntasse o que deverá ser doce, talvez não saiba responder. Tudo é tão vago como se fosse nada."
Fechou os olhos do corpo. Abriu os olhos da alma. Dormiu de conchinha com o sonho.
Nossa, me toquei com esse, muito bom, parabens. (Diego Steyner)
ResponderExcluirfoi mal aí se sua amiga n te enche de orgulho como a minha.
ResponderExcluirq lindo, pipoca!
como podem palavras terem tantos sabores?
ResponderExcluirBelíssimo texto.
cansei de (do meu) mistério. decidi dar o nome a tapas. =p~
ResponderExcluirvim perguntar: e ae amarela, vai atualizar mais n?
Diego, Caio e Anna: obrigada pela visita, querid@s. E pela paciência em ler o texto. As doces bagatelas de vocês são sempre bem-vindas ao Belas. #)
ResponderExcluirEu vou atualizar, Nan. Não sei quando, mas logo pinta um novo devaneio por aqui. ;)
Cheiros!