I
Tive medo, eu não te disse. O meu no seu olhar, fixo, buscando um não-sei-o-quê meu que ao menor descuido caiu dentro do seu, e por lá ficou. Eu não tive medo de cair dentro, eu não desviei e se pisquei foi por instinto. Nessa hora, você me disse corajosa, me descreveu como moça primeira a fincar bandeira no alto do seu Eu, depois me chamou doente, me falou sobre olhares que se encontraram aos seus e depois desses não encontraram a mais nada e ninguém: cegaram-se. Ainda assim, não desviei. Agora você me achou doce e delicada, quase indefesa; mentalmente, comparou-me, comovido, aos filhotes recém-nascidos de sua cadela. Veio caminhando os dedos até a minha mão, que externava sutilmente a carência de toda a matéria que me faz, acenando parada como quem diz: estou aqui para ser tocada. Tocou-a com uma das suas, a que veio como se a palma fosse carregada por um batalhão de soldados marchando apressados; puxou-a cerca de três centímetros mais para perto de você e com a outra deu três tapinhas na face da minha, que estava entre as duas suas, e sussurrou algo que se bem me lembro teve a ver com o pedido da sobremesa. A outra minha que sobrou, ocultada embaixo da mesa – você não sabe –, eu apertava forte entre as minhas pernas, tentando conter o arrepio. Não contive, e você olhou os pêlos dos meus braços se eriçarem. Enrubesci, pude sentir as maçãs esquentando-se gradualmente, até ferver. Rimos. Suas mãos voltaram lentas até repousarem pesadas sob suas pernas tortas de tão compridas. Tive a impressão de que o trajeto retangular da mesa tivesse sido tanto desgastante e cansativo quanto correr 4 km ao meio dia. De novo os nossos olhos paralelos, de novo o papo sobre “se você fosse para uma ilha deserta, quem e o quê levaria?”.
Tive medo, eu não te disse. O meu no seu olhar, fixo, buscando um não-sei-o-quê meu que ao menor descuido caiu dentro do seu, e por lá ficou. Eu não tive medo de cair dentro, eu não desviei e se pisquei foi por instinto. Nessa hora, você me disse corajosa, me descreveu como moça primeira a fincar bandeira no alto do seu Eu, depois me chamou doente, me falou sobre olhares que se encontraram aos seus e depois desses não encontraram a mais nada e ninguém: cegaram-se. Ainda assim, não desviei. Agora você me achou doce e delicada, quase indefesa; mentalmente, comparou-me, comovido, aos filhotes recém-nascidos de sua cadela. Veio caminhando os dedos até a minha mão, que externava sutilmente a carência de toda a matéria que me faz, acenando parada como quem diz: estou aqui para ser tocada. Tocou-a com uma das suas, a que veio como se a palma fosse carregada por um batalhão de soldados marchando apressados; puxou-a cerca de três centímetros mais para perto de você e com a outra deu três tapinhas na face da minha, que estava entre as duas suas, e sussurrou algo que se bem me lembro teve a ver com o pedido da sobremesa. A outra minha que sobrou, ocultada embaixo da mesa – você não sabe –, eu apertava forte entre as minhas pernas, tentando conter o arrepio. Não contive, e você olhou os pêlos dos meus braços se eriçarem. Enrubesci, pude sentir as maçãs esquentando-se gradualmente, até ferver. Rimos. Suas mãos voltaram lentas até repousarem pesadas sob suas pernas tortas de tão compridas. Tive a impressão de que o trajeto retangular da mesa tivesse sido tanto desgastante e cansativo quanto correr 4 km ao meio dia. De novo os nossos olhos paralelos, de novo o papo sobre “se você fosse para uma ilha deserta, quem e o quê levaria?”.
Gostei. Gosto dessa inocência fingida das coisas que você escreve. E dessa prolixidade.
ResponderExcluirDá um ar meio digestivo, mas como se tivesse digerindo um doce.
To gostando do lirismo desse geração. Nasce sem querer e acaba ficando. Como se fosse duas mãos se encostando de repente, sem querer, mas as mil sensações que isso desencadeia.